O SIGNIFICADO DA ARTE


A arte contemporânea é a arte de mostrar sem demonstrar, com toda a liberdade, uma arte desenvolta para dizer “outra coisa” sem discursar. Principalmente nas artes plásticas, a liberdade de provocação da sensibilidade, com o simbólico, é ilimitada. Com o abandono sistemático do Belo, definido por Nietzsche em O nascimento da tragédia, como rumo a arte da atualidade caracteriza-se cada vez mais como contestadora e subversiva. E, sobretudo, pretensiosa.
Kasimir Malevitch, com o Suprematismo, não só revoluciona a definição e o propósito da arte como também demonstra um conflito permanente - o termo mais apropriado talvez seja “concorrência” – entre arte e filosofia. Em Mundo não-objetivo, nega a existência do discurso e da lógica afirmando “que os fenômenos visuais do mundo objetivo não têm, em si, qualquer significado”. Para ele, “essencial é o sentimento como tal, completamente independente do meio em que foi evocado”. Definindo uma de suas poucas obras suprematistas, “Quadrado preto sobre fundo branco”, esclarece que “foi a primeira forma de expressão do sentimento não-objetivo: o quadrado sendo o sentimento e o fundo branco o Nada exterior a esse sentimento”. A arte é, mesmo se pode parecer paradoxal, transcendência da realidade e análise psicológica dos que contemplam uma obra. É o indivíduo quem faz, interpretando e opinando, a obra tornar-se universal. Mas, segundo Heidegger, desde van Gogh, a arte já tinha a pretensão de tornar visível o universal, mesmo se os recursos técnicos da época eram menores.
Ao inserir o progresso artístico no processo histórico, perceber-se-á a existência de um sentido na arte. Mas a relação, diferentemente de como a entenderam Marx e Engels, entre arte e história não só se caracteriza pelo conflito entre superestrutura e infra-estrutura. Os artistas estão sempre um passo à frente dos outros homens. O que dificulta ainda mais o entendimento do progresso artístico é que nem todos os artistas evoluem da mesma forma. No quadro Angelus Novus de Paul Klee, o anjo pode representar o artista explodindo para a frente mas com medo por não saber sua direção. Essa falta de segurança do artista, geralmente velada pela arrogância e pelo desprezo do outro, cria um momentode estagnação. É o anjo-artista de Klee, congelado, levado para a frente mas olhando para trás.
Principalmente a partir do século XVIII, as eras de estagnação artística, nas quais só o artista está além, são as menos produtivas. Há a banalização da comunicação artística que é literalmente ingerida no sistema dominante. Foi o que aconteceu após a Revolução de 1930 no Brasil em que o movimento modernista tornou-se arte de massas sem haver outra corrente consistente para substitui-lo na vanguarda artística brasileira. Essas fases históricas são difíceis de serem vencidas e, geralmente ocorre uma era de violência. Denunciando a celebração fascista como o cúmulo doart pour l’art, Walter Benjamin, em A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, conclui: “Na época de Homero, a forma humanidade oferecia-se em espetáculo aos deuses olímpicos; agora, ela se transforma em espetáculo para si mesma. Sua auto-alienação atingiu o ponto que lhe permite viver sua própria destruição como um prazer estético de primeira ordem.” A perversão da arte leva à perversão do homem, principalmente no século XX no qual o progresso e a expansão dos meios de comunicação criaram blocos massificados de população que têm acesso à cultura.
Na atualidade, o verdadeiro sentido da arte é o da educação. Klee, afirmando que “a arte não reproduz o visível, mas torna visível”, caracteriza o papel do artista como o de um professor que esclarece a seus alunos as dúvidas, neste caso ligadas à realidade. O artista é sempre o mais experiente que tem que passar seu conhecimento. A arte, especialmente a arte contemporânea, busca a destablização das verdades originárias, a ruptura com os princípios bem instalados, a destruir as evidências imediatas e a atordoar as mentes com questões como a da realidade e de sua representação. O artista contemporâneo quer transformar e formar mentes e só o consegue revolucionando a realidade. Por dominar tão bem as técnicas, não transcende para, mas simplesmente transcende. Ele transcende tudo: idéias, objetos, homens, abstrações... A arte é inovadora. Mas nem sempre a inovação decorre de uma revolução técnica. Courbet, com “A origem do mundo” em 1866 choca – termo que no mundo artístico é quase sinônimo de inovar – pelo realismo com o qual reproduz o sexo feminino.
Desde a distinção clara entre artista e artesão, a verdadeira criação artística deixou de estar presa ao seu sistema. Na Idade Média, autores como Chrétien de Troyes entendiam a arte como a técnica da escrita. Não havia diferenças, no status do trabalho, entre um ferreiro e um escritor. Na atualidade, entre a arte e o simples manuseio de uma técnica há uma diferença enorme. Como o explicou Georges Duby, a principal distinção seria que a arte é para o intelecto enquanto o artesanato é útil na realidade física. A arte superou a realidade física, mas também a histórica. Em Como Wang-Fô foi salvo, Marguerite Yourcenar mostra o processo de superação do real pela obra de arte. O principal protagonista penetra um de seus quadros, entrando numa outra realidade, a que criou.
O artista atual, mesmo tendo uma consciência que não consegue nem deve reprimir, precisa manter, em suas obras, uma certa imparcialidade em relação à política. Aragon “sujou” sua reputação ao elaborar “Ode a Stálin” no qual louva as qualidades do líder soviético que é considerado o maior carrasco da história. As ligações diretas entre arte e política são quase sempre infelizes. Isto porque, mesmo se o rumo da arte não é mais definido, a obra de arte deve continuar sendo um meio de enfraquecer o regime político dominante. Se não o for, perde sua essência contestadora. Já teorias, como a dadaísta, por mostrarem o pensamento de um homem são totalmente individuais. A influência política sobre uma obra de arte deve ser indireta, pois a arte atual busca o desprendimento do indivíduo com sua realidade.
A arte nazista, cujas bases foram definidas por Hitler no seu discurso de inauguração da “Grande Exposição de Arte alemã”, em 1937, é a melhor prova para mostrar a perversão da arte dirigida pela política. Hitler tentou apagar a memória do povo alemão, para melhor dominá-lo. Para isso, criou um movimento artístico extremamente acadêmico e conservador. Quis afastar o povo alemão de correntes de pensadores que poderiam atrapalhá-lo na sua ascensão ao poder. Por isso declarou: “cubismo, dadaísmo, futurismo, impressionismo, etc. nada têm a ver com nosso povo alemão”. Esse bloqueio cultural que faz Hitler mostra a facilidade, no século XX, de manipular-se as massas. A arte, então, deixa de ser um meio de superar a realidade para tornar-se um meio de pervertê-la.
A sociedade atual vive um sério problema que é a manipulação das massas pela arte. O desenvolvimento dos meios de comunicação fez com que o acesso à cultura fosse mais generalizado mas também facilitou a manipulação das massas. A arte precisa de uma definição clara. Hoje em dia, tudo pode ser arte. O que antes era um conceito revolucionário, com poucos criadores mas muitos possuidores, tornou-se num verbete corriqueiro. A arte atual está perdendo seu significado, mesmo se há ainda verdadeiros artistas, para tornar-se uma moda. A massa vê no artista erroneamente idolatrado uma forma de líder no qual identifica-se. A verdadeira obra de arte está sendo criticada em favor do academicismo. O homem, consciência contempladora, perdeu o gosto pela obra de arte universal e que transcende a realidade.
Walter Benjamin, no texto já citado, afirma que há, além de um manipulação indevida das massas pela arte, processo de destruição da aura das obras artísticas pela reprodutibilidade técnica. Mas sua tese é muito exagerada. As reproduções de obras é um meio de lucrar com as obras- capitalismo
-socializa obras
-geralmente vendidas nos museus, só serve se houver bagagem cultural
-o homem está afastando-se das obras por não se interessar mais, não que a aura tenha sido destruída
-o progresso só a faz desenvolver-se cada vez mais: a arte está cada vez mais rica em capacidades mas continua num momento de estagnação àfotos/cinema
-o artista não consegue aparecer
O progresso pode ser bom
A obra de arte desafiada, mas w. benjamin está errado venda de reproduções nos museus, lado comercial mas também da memória – a aura e o Belo


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